Essa descoberta representa a primeira evidência concreta de repasses financeiros para servidores do STJ no inquérito que investiga suspeitas de corrupção no tribunal. Considerado o segundo mais importante do país, o STJ está no centro de uma investigação que já levou à prisão o lobista Andreson Gonçalves em novembro do ano passado. Ele é suspeito de envolvimento em crimes relacionados à sua atuação no STJ e em outras instâncias judiciais.
Transferências e empresas envolvidas
A PF identificou as movimentações financeiras ao analisar a quebra de sigilo bancário dos investigados. As transferências partiram da empresa Florais Transportes, sediada em Cuiabá, pertencente a Andreson Gonçalves. Entre maio de 2021 e dezembro de 2023, a Florais fez 45 repasses para a Marvan Logística, cujos valores variavam entre R$ 1.000 e R$ 250 mil.
A empresa Marvan Logística pertence à esposa de Márcio Toledo Pinto, assessor do STJ afastado após a operação da PF em novembro. Segundo os investigadores, há indícios de que a empresa seria uma fachada, pois não possui funcionários registrados e declara como atividade o transporte rodoviário de cargas.
"Analisando os dados bancários da empresa Florais Transportes, foram identificadas diversas transferências para a empresa Marvan Logística, o que aparentemente reflete na confirmação dos atos de corrupção praticados pelo servidor Márcio, por intermédio do lobista Andreson", diz o relatório da PF.
Os pagamentos coincidem com períodos em que o lobista obteve acesso antecipado a minutas de decisões judiciais, redigidas no STJ antes das manifestações oficiais das ministras envolvidas.
Vazamento de informações e influência em processos
Toledo Pinto atuou nos gabinetes das ministras Nancy Andrighi e Isabel Gallotti, onde preparava minutas de decisões judiciais. A investigação aponta que ele acessou e modificou processos suspeitos dentro do sistema do STJ. Esses são os casos em que o lobista obteve acesso prévio às minutas das decisões antes da divulgação oficial.
A PF já identificou ao menos 13 processos dos gabinetes das ministras em que houve vazamento de informações: oito no gabinete de Isabel Gallotti e cinco no de Nancy Andrighi. Não há, até o momento, ministros formalmente investigados no inquérito.
A suspeita é de que o servidor atuava para favorecer interesses do lobista, repassando-lhe informações sigilosas que poderiam influenciar decisões judiciais. Para a PF, as transferências de dinheiro entre as empresas ligadas aos envolvidos podem configurar crimes de corrupção e lavagem de dinheiro.
Possível ampliação das investigações
O relatório enviado ao STF sugere que novas frentes de investigação podem ser abertas a partir da análise do sigilo bancário de Andreson Gonçalves. Além dos gabinetes das ministras Nancy Andrighi e Isabel Gallotti, a PF também investiga possíveis irregularidades nos processos conduzidos pelos ministros Moura Ribeiro e Og Fernandes.
No caso de Og Fernandes, o foco está em seu ex-chefe de gabinete, Rodrigo Falcão. Segundo a investigação, Falcão teria adquirido joias em dinheiro vivo e discutido processos do STJ com sua irmã, que é advogada. Essas informações já haviam sido reveladas anteriormente pelo UOL.
Respostas dos citados
A defesa de Márcio Toledo Pinto afirmou que não irá se manifestar, enquanto os advogados de Andreson Gonçalves não responderam sobre os pagamentos. Em manifestações anteriores, a defesa do lobista alegou que não há provas de que ele tinha influência em decisões judiciais.
O STJ informou, por meio de nota, que mantém investigações internas sobre as suspeitas de vazamento de informações e influência indevida em decisões. "O STJ está procedendo às investigações relacionadas às supostas divulgações de informações sigilosas, influência em decisões e demais infrações correlacionadas que possam ter sido praticadas por servidores do STJ", afirmou a corte.
Além disso, o tribunal destacou que foram abertos dois processos administrativos disciplinares e uma sindicância investigativa. Os procedimentos são sigilosos e seguem em andamento.
Até o momento, as ministras citadas na investigação não se manifestaram.