A análise de Francisco Lealli, publicada no Estado de S. Paulo, aponta que, quase dois anos após os atos extremistas de 8 de janeiro de 2023, o Exército Brasileiro mantém sob sigilo a identidade de quem ordenou o uso de blindados para impedir prisões no Quartel-General (QG) em Brasília. Naquela noite, a movimentação militar teria dificultado a ação das forças de segurança, adiando as detenções para o dia seguinte. Segundo o texto, “o gesto de força impediu que policiais entrassem no setor militar para prender os responsáveis pelos atos de depredação”.
A decisão de adiar as prisões foi justificada por lideranças militares como uma medida para evitar um “banho de sangue”. O local abrigava não apenas manifestantes, mas também parentes de oficiais, incluindo a esposa do ex-comandante do Exército, general Villas Bôas. Mesmo assim, quando as prisões foram realizadas na manhã do dia 9 de janeiro, nenhum familiar de membros do oficialato foi incluído na lista de detidos, como destaca Lealli.
O Exército se recusou a identificar quem deu a ordem para o uso de blindados, apesar de solicitações feitas com base na Lei de Acesso à Informação (LAI). Um requerimento enviado em janeiro de 2023 foi negado pela Força, e o caso chegou à Controladoria Geral da União (CGU) em fevereiro. Após meses de análise, a CGU determinou que o Exército deveria fornecer a informação, mas, como ressalta a análise, “a Força Militar informou que os documentos estavam em sigilo e que haviam sido repassados ao Supremo Tribunal Federal”.
Soldados do Exército brasileiro. Foto: reprodução
Mesmo após nova cobrança da CGU, o Exército limitou-se a uma “apuração sumária”, realizada de maneira apressada e sem revelar os responsáveis. Lealli observa que, em dezembro de 2023, a CGU decidiu enviar o caso ao Centro de Controle Interno do Exército para apurar a conduta. No entanto, o processo ficou parado na Controladoria até outubro de 2024, quando foi retomado após questionamentos do Estadão. “Apenas depois da pressão pública, a CGU enviou ofício ao general Richard Nunes, chefe do Estado-Maior do Exército, exigindo esclarecimentos”, aponta o analista.
A resposta final do Exército, enviada em 26 de dezembro de 2024, não trouxe novidades. O relatório sumário, assinado pelo coronel Marcus Porto de Oliveira, arquivou o caso com base na alegação de que “tudo foi feito como manda a lei”. Lealli critica a postura, afirmando que “a CGU, ao invés de insistir no cumprimento da decisão, optou por dar o caso por encerrado, destacando que não tem competência para abrir sindicâncias contra militares”.
Dois anos após os atos golpistas, a ausência de transparência em torno de decisões fundamentais reforça a percepção de impunidade. Lealli conclui que a postura do Exército e da CGU “demonstra uma resistência à responsabilização e mantém sob sigilo informações essenciais para compreender os bastidores da noite de 8 de janeiro de 2023”.