Esse foi o ponto central da fala do Ministro da Justiça e da Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, no seminário “Os Desafios da Segurança Pública no Brasil: Desafios Jurídicos e Institucionais” ao defender a PEC da Segurança Pública proposta pelo governo.
O evento promovido pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP) reuniu o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal; Tarcísio de Freitas (Republicanos), governador de São Paulo; Ricardo Lewandowski, ministro da Justiça e Segurança Pública; Raul Jungmann, ex-Ministro da Defesa e Segurança Pública; e a professora Joana Monteiro, coordenadora do Centro de Ciência Aplicada à Segurança Pública da Fundação Getúlio Vargas.
Segundo Lewandowski, é preciso alterar a redação dos artigos 21, 22, 23 e 24 da Constituição — que tratam das competências da União, privativas ou em comum com estados, municípios e Distrito Federal, além do artigo 144 que detalha quais são os órgãos que compõem o sistema de segurança pública do país. “Não alteramos uma vírgula da competência dos governadores na proposta”, afirmou.
O ministro fez questão de deixar claro que a proposta do governo não altera em nada a competência dos estados e municípios sobre o tema. Ele explicou que a maior novidade da proposta é aumentar o escopo de atuação da Polícia Rodoviária Federal, uma força que conta com 13 mil homens civis, muito bem armados e distribuídos em 27 superintendências em todo o país.
“Estou propondo que a Polícia Rodoviária Federal se transforme em uma polícia ostensiva federal. Porque de fato ela já está fazendo isso não com base na Constituição, mas por base em uma portaria dos ministros que me precederam”, disse.
A nova polícia ostensiva federal poderia, excepcionalmente por autorização do ministro, fazer o policiamento externo quando for necessário e auxiliar forças policiais estaduais quando for solicitada pelos governadores.
Atuação da União e PEC
O ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Raul Jungmann endossou a proposta do governo e defendeu a atuação da União na segurança pública.
Ele explicou que o atual modelo de combate ao crime é ineficaz e que todos os comandos constitucionais que seriam alterados pela reforma não preveem ou preveem muito pouco a participação da União. “Não há absolutamente nada, não há contribuição definida, não tem participação”, criticou.
Jungmann explicou que a PEC poderá definir a origem dos fundos necessários para maior participação do governo federal na segurança pública, assim como na saúde e na educação.
Quem também defendeu maior participação do governo na segurança foi a professora Joana Monteiro, coordenadora do Centro de Ciência Aplicada à Segurança Pública da Fundação Getúlio Vargas.
“A liderança do governo federal é absolutamente fundamental para desenhar estratégias específicas para crimes específicos e para problemas de segurança específicos. Precisamos de um sistema de informação robusto na área de segurança pública para permitir que os prefeitos e governadores possam implementar políticas públicas locais de impacto. Esses dados têm que pautar a atuação do Poder Público, mas atualmente não temos uma base de dados. Não existe um dado sobre reincidência de crimes no Brasil, por exemplo”, destaca.
Anfitrião do evento, o decano do STF, ministro Gilmar Mendes, destacou a diversidade das visões sobre segurança pública e o alto nível da discussão no seminário. “É claro que a PEC proposta pelo governo envolve delicadezas de competências dos estados, mas estamos vendo nos últimos anos que o sistema como está é insuficiente. É fundamental que se aprofunde o diálogo entre governo federal, estados e municípios”, afirmou ao lembrar que defende uma maior integração de União, estados e municípios desde o tempo que presidiu o CNJ, em 2010.
Apresentação dos números da segurança publica. Foto: Divulgação
Mea culpa
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, aproveitou sua fala para reiterar que a violência policial será combatida em seu governo e admitiu que estava errado sobre a necessidade de implementação de câmeras corporais na PM paulista.
“Eu particularmente me arrependo muito da postura reativa que eu tive lá atrás. Uma postura que partiu da percepção que aquilo poderia tirar a segurança jurídica do agente ou mesmo causar hesitação no momento em que ele precisava atuar. Hoje eu percebo que estava enganado, que ela [a câmera corporal] ajuda o agente”.
A revisão da posição em relação ao uso das câmeras corporais foi provocada por uma série de episódios recentes de violência policial da PM de São Paulo que foram flagrados por câmeras. Dois casos ganharam ampla repercussão: em um deles um PM joga um homem de uma ponte depois de uma abordagem; no outro, um policial de folga matou, com 11 tiros pelas costas, um homem que havia furtado pacotes de sabão de um mercado.
O governador deixou claro que esse tipo de conduta será combatida por sua administração e disse que as câmeras corporais irão funcionar como um fator de contenção.
“A grande desafio é como garantir a segurança jurídica daquele agente que está lá na ponta. Que atua, que precisa combater a criminalidade, que está extremamente estressado e está sofrendo o tempo todo. Como não deixar que esse agente público seja esculhambado, seja alvo das piores relações, mas, ao mesmo tempo, não permitir o descontrole”, defendeu.
Tarcísio evitou endossar publicamente a proposta do governo federal, mas afirmou que irá trabalhar para que os governadores discutam com o ministro Lewandowski o texto da PEC e, partir de um consenso, se possa trabalhar para sua aprovação.