O presidente Lula está se preparando para uma reforma ministerial que visa reforçar o apoio de grupos-chave em sua base eleitoral. De acordo com interlocutores do Palácio do Planalto, ele pretende convidar um representante da Frente Parlamentar Evangélica para comandar um ministério, com a possibilidade de ser uma mulher, buscando, assim, fortalecer os laços com o eleitorado evangélico e fazer um aceno ao público feminino.
Esse movimento ocorre em um momento de crescente tensão política, onde o governo do PT busca solucionar resistências dentro desses segmentos. A articulação do governo com os evangélicos já vinha sendo discutida nos últimos meses e deve se intensificar após as eleições para a presidência da Câmara e do Senado, previstas para fevereiro de 2025.
O objetivo é estruturar uma equipe ministerial que reflita a nova correlação de forças no país, especialmente com foco nas eleições para os governos dos estados e uma possível candidatura de Lula à reeleição em 2026. Com uma representatividade de cerca de 30% da população brasileira, o segmento evangélico tornou-se um fator determinante para o sucesso político no Brasil.
As articulações do Planalto buscam alinhar-se a esse grupo, considerado essencial para o futuro político do presidente. Entre os nomes cogitados para ocupar o ministério, destacam-se a senadora Eliziane Gama (PSD-MA) e a deputada Benedita da Silva (PT-RJ), que já ocupou o cargo de ministra no primeiro mandato de Lula.
O ministério mais disputado pelos evangélicos é o de Desenvolvimento Social, atualmente sob a responsabilidade do senador Wellington Dias (PT), onde o programa Bolsa Família — uma das principais vitrines do governo — é gerido. O governo está de olho em fortalecer sua relação com este segmento, que já demonstrou apoio nas urnas, mas ainda é considerado um alvo de disputa política.
Apesar da disposição de diálogo, o presidente da Frente Parlamentar Evangélica, Silas Câmara (Republicanos-AM), afirmou que não há compromisso formal com o governo e criticou algumas posturas adotadas pelo Planalto. Câmara mencionou, por exemplo, as resoluções sobre educação infantil e a nota técnica sobre o aborto legal, que, mesmo derrubadas, indicam que algumas áreas do governo não correspondem às expectativas do segmento evangélico.
O presidente da Frente destacou ainda que o conservadorismo está em ascensão globalmente, citando a vitória de Donald Trump como um exemplo de como ignorar o desejo da população pode resultar em consequências eleitorais negativas.
“A eleição nos Estados Unidos demonstrou, de forma clara, o que acontece quando os políticos não respeitam o sentimento da população”, afirmou ele, alertando o governo sobre o risco de deslegitimar a relação com os evangélicos.
Para suavizar as tensões, dois ministros têm sido os principais responsáveis por dialogar com os evangélicos: Jorge Messias (AGU) e Alexandre Padilha (Relações Institucionais). Messias, que tem raízes em uma família batista, é visto como uma importante “ponte” entre o governo e as diversas denominações evangélicas, transmitindo a mensagem de que o governo respeita os valores cristãos.
Em um momento delicado, o ministro Messias esteve presente em uma reunião onde Lula se referiu ao “livramento” que teria recebido após sofrer uma queda no Palácio da Alvorada, o que reforçou a relação simbólica com os evangélicos.
“O presidente falou para nós: ‘Ainda bem que oraram por mim’. Ele sentiu que a mão de Deus o livrou de coisa pior”, relatou Messias, referindo-se à sensação de proteção divina vivida por Lula após o incidente.
A relação da Frente Parlamentar Evangélica com o ex-presidente Jair Bolsonaro, embora inicialmente promissora, tem sido marcada por uma série de desentendimentos. Deputados evangélicos, como Otoni de Paula (MDB-RJ), afirmam que Bolsonaro nunca deu o devido prestígio à bancada durante seu governo, criando um vácuo político que favoreceu a aproximação com o governo atual.
Apesar de críticas internas e divisões no bolsonarismo, uma ala evangélica do Congresso tem se mostrado disposta a apoiar Lula, embora de forma mais discreta, buscando uma posição estratégica sem o estigma de alinhamento à esquerda, informa reportagem do Globo.
De acordo com o cientista político Vinícius do Valle, essa ala acredita que sua presença no governo será fundamental para influenciar as políticas públicas, sem comprometer a imagem junto ao eleitorado conservador. Enquanto o governo Lula tenta consolidar sua relação com os evangélicos, ainda restam incertezas sobre o real impacto dessas articulações na governabilidade.
Embora o grupo seja essencial para o sucesso eleitoral de Lula, ele também enfrenta resistência interna, principalmente de setores ligados a Bolsonaro. Além disso, a possibilidade de uma reforma ministerial, que pode incluir a criação de um ministério voltado para os evangélicos e mulheres, pode ser a chave para garantir estabilidade política no futuro próximo.