Entre as evidências apontadas pela Polícia Federal (PF) de que Jair Bolsonaro comandou uma organização criminosa para desviar mais de R$ 6 milhões com vendas ilegais de joias e artigos de luxo do Estado brasileiro recebidos em viagens oficiais, está uma conversa via WhatsApp com o ex-ajudante de ordens Mauro Cid em que o ex-presidente trata diretamente sobre levar parte desses itens aos Estados Unidos.
O diálogo em questão consta no relatório sobre o indiciamento de Bolsonaro e outras 11 pessoas por associação criminosa, peculato e lavagem de dinheiro enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF), cujo sigilo foi derrubado nesta segunda-feira (8).
O
documento mostra que, em 29 de dezembro de 2022, véspera da viagem que
Bolsonaro fez aos EUA pouco antes de encerrar seu mandato, Cid fez a
seguinte pergunta ao ex-presidente: “O senhor vai trazer árvore e o barco?”.
Trata-se de uma referência às miniaturas de uma palmeira e de um barco
que o ex-chefe do Executivo recebeu em uma viagem ao Oriente
Médio. Bolsonaro respondeu ao ex-ajudante de ordens com duas mensagens, apagadas logo na sequência. Cid, então, diz: "Sim, senhor".
A conversa desmente totalmente a versão de Bolsonaro de que nunca se envolveu em conversas sobre as joias recebidas. E pior: evidencia que o ex-presidente temia ter seu plano descoberto, já que apagou as mensagens.
Segundo a PF, a ordem de Bolsonaro foi obedecida e o conjunto de luxo contendo as miniaturas de árvore e barco seguiram para os EUA aos cuidados do general Mauro Lourena Cid, pai do ex-ajudante de ordens e que, segundo investigadores, teria negociado a venda de joias no país da América do Norte para depois repassar o dinheiro em espécie ao ex-presidente.
Diz trecho do relatório da PF:
“No dia 29 de dezembro de 2022, às vésperas desta viagem da comitiva presidencial para os Estados Unidos da América, MAURO CID envia mensagens para o contato “Pr Bolsonaro 2023”, questionando assuntos sobre a viagem. MAURO CID pergunta: “O senhor vai trazer árvore e o barco?”: Diante da pergunta de MAURO CID “O senhor vai trazer árvore e o barco?”, JAIR BOLSONARO envia duas mensagens, mas essas foram apagadas. Na sequência, MAURO CID respondeu “Sim senhor”. Além dessa sequência cronológica, sabe-se que o material seguiu para os Estados Unidos da América, mais especificamente para a casa de LOURENA CID, pai de MAURO CID.
Sendo assim, apesar das mensagens suprimidas, diante da pergunta e resposta afirmativa de MAURO CID, fica evidente a essência das mensagens e a obediência de MAURO CID em levar o material para fora do país.”
O ex-presidente Jair Bolsonaro teria recebido dinheiro em espécie em mãos oriundo da venda de joias que ele teria subtraído do acervo presidencial em um esquema criminoso para desviar R$ 6,8 milhões. É o que aponta o relatório da Polícia Federal (PF) sobre o indiciamento do ex-mandatário e outras 11 pessoas por associação criminosa, peculato e lavagem de dinheiro enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF), cujo sigilo foi derrubado nesta segunda-feira (8).
No documento enviado ao STF constam mensagens trocadas entre o ex-ajudante de ordens Mauro Cid e o ex-assessor Marcelo Câmara nas quais fica claro que ambos discutiam a melhor maneira de fazer o dinheiro da venda ilegal das joias chegar até o ex-presidente. Em dado momento, Cid sugere evitar transferências bancárias, que deixa rastros, e propõe entregar os valores a Bolsonaro "em cash", isto é, em espécie.
O diálogo via WhatsApp entre Cid e Câmara foi registrado em 18 de janeiro de 2023, quando o ex-assessor estava com Jair Bolsonaro em Orlando, nos EUA. Na conversa, Cid tenta organizar o repasse ao ex-presidente, revelando que seu pai, o general Mauro Lourena Cid, que teria negociado venda de joias no país da América do Norte, possuía R$ 25 mil de uma dessas vendas.
“Eu estava vendo o que era melhor fazer com esse dinheiro levar em ‘cash’ aí. Meu pai estava querendo inclusive ir aí falar com o presidente (…) E aí ele poderia levar. Entregaria em mãos. Mas também pode depositar na conta (…). Eu acho que quanto menos movimentação em conta melhor, né?", diz Cid.
“O relógio, aquele outro kit lá, vai pro dia 7 de fevereiro, vai pra leilão. Aí vamos ver quanto que vão dar”, afirma ainda o ex-ajudante de ordens.
Além de ficar explícito que Cid planejava entregar o dinheiro das joias a Bolsonaro sem deixar rastro, outra troca de mensagens mostra que o ex-presidente deu aval para que um kit de pedras preciosas, também subtraído ilegalmente do acervo presidencial, fosse a leilão nos EUA.
Em 4 de fevereiro de 2023, Cid enviou a Bolsonaro, via WhatsApp, o link com informações sobre um leilão nos EUA para tentar vender um kit de joias de ouro rose, que ocorreria quatro dias depois. Bolsonaro, prontamente, respondeu: "Selva".