O jornal estadunidense The New York Times destacou em matéria neste domingo (30) a atuação do ministro Alexandre de Moraes, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) durante a campanha eleitoral de 2022, como elemento para conter o autoritarismo do ex-presidente de extrema direita. O periódico descreve que ao longo do Governo Bolsonaro a independência judicial ficou ameaçada, mas sobreviveu após atravessar uma eleição crucial.
A reportagem relembrou que ex-presidente air Bolsonaro (PL) atacou a Suprema Corte depois que o tribunal decidiu contra ele em várias questões, e em agosto de 2021, ele pediu ao Senado o impeachment de um dos juízes, Alexandre de Moraes. Um mês depois, em um discurso inflamado para mais de 100 mil manifestantes, Bolsonaro disse que não seguiria as decisões de Moraes. Uma multidão se reuniu no tribunal, ameaçando invadi-lo.
Então, no período que antecedeu as eleições de 2022 no Brasil, Moraes, que também era o chefe das eleições, ordenou a remoção de milhares de postagens nas redes sociais para deter a disseminação de desinformação e tomou outras medidas extraordinárias para enfrentar ataques antidemocráticos de Bolsonaro, que foi posteriormente derrotado pelos eleitores.
Democracias em apurosO NYT traça um paralelo da situação brasileira com a que está sendo vivenciada em Israel. Na última quarta-feira (25), a Suprema Corte de Israel anunciou que revisaria uma nova lei projetada para limitar seu poder, criou-se uma escolha complicada para si mesma. Ela confrontará diretamente os poderes eleitos do governo ao derrubar a lei? Ou, em vez disso, decidirá de forma a evitar uma crise constitucional?
Nas últimas décadas, escreve o jornal, as tentativas de enfraquecer os tribunais em todo o mundo se tornaram sinais recorrentes de que uma democracia está em apuros. Ataques à independência judicial foram os primeiros passos em direção ao domínio de um único partido em países como Rússia, Turquia e Venezuela, por exemplo.
No entanto, uma tentativa de limitar a autoridade dos tribunais - como a nova lei adotada pela coalizão de direita do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, que impede os juízes de usarem o antigo princípio jurídico de "razoabilidade" para anular decisões do governo - não torna o colapso democrático inevitável. É mais como um sinal de alerta, e como o judiciário responder pode começar a decidir quanta destruição será causada.
Exemplo na Hungria
O jornal dos EUA cita o caso da Hungria, que se tornou uma democracia plena depois que a União Soviética afrouxou seu controle sobre o leste europeu em 1989, com o novo Tribunal Constitucional Húngaro atuando como principal controle sobre a única casa do Parlamento e o primeiro-ministro do país.
Mas em 2010, o primeiro-ministro Viktor Orban venceu as eleições com uma supermaioria no Parlamento, que seu partido governante então usou para emendar a Constituição e reduzir o poder do alto tribunal de revisar a legislação. O governo também aumentou o número de juízes e entregou as novas nomeações ao Parlamento.
Uma pequena maioria no tribunal tentou resistir, por exemplo, anulando uma lei de registro de eleitores como uma barreira desnecessária para participar das eleições. Mas Orban e seu partido emendaram a Constituição novamente para anular várias decisões do tribunal, assumindo o controle do conselho nacional de mídia, da comissão eleitoral e de outras instituições-chave.
O exemplo húngaro, e mudança rápida no sistema judicial que tem alimentado temores em Israel, onde os tribunais também servem como uma das únicas verificações formais sobre o poder de um Parlamento com apenas uma casa, e onde Netanyahu e seus aliados também propuseram projetos de lei para restringir ainda mais a revisão judicial e dar ao governo maior controle sobre a nomeação de juízes. E ao contrário da Hungria, Israel não possui uma constituição. Netanyahu precisa apenas de maioria simples para mudar as Leis Básicas do país, que estabelecem os padrões nacionais.
A deterioração democrática ocorreu de forma mais lenta após os tribunais serem atacados em outros países, às vezes com mudanças que podem parecer inofensivas à primeira vista.
Governo da Polônia passou a controlar judiciário
Relata ainda o jornal que, na Polônia, por exemplo, após o partido de direita Lei e Justiça vencer a presidência e obter maioria parlamentar em 2015, foi determinada a aposentadoria de juízes de tribunais inferiores com mais de 65 anos. O governo também assumiu o controle do órgão independente que faz nomeações judiciais e criou uma nova câmara disciplinar que pode punir juízes e já atingiu mais de mil deles.
O Tribunal Constitucional da Polônia não invalidou essas mudanças; o governo já havia se movimentado para subjugá-lo. Mas outros juízes denunciaram publicamente as ações e encontraram apoio de uma ampla seção da sociedade civil e dos partidos de oposição poloneses, que realizaram protestos de massa nas ruas e apelaram à União Europeia - a Polônia se tornou membro em 2004 - por ajuda.
Em junho, o Tribunal de Justiça da União Europeia decidiu que a Polônia violou o direito da UE ao diminuir a independência e a imparcialidade do judiciário. Os protestos contra o governo continuaram, e a oposição tem chance de vencer as eleições neste outono.
Direita da Índia avança sobre judiciário
Na Índia, reporta o NYT, também, o esforço de um governo de direita para dominar o judiciário ainda está em curso. A seleção de novos membros do Supremo Tribunal indiano estava nas mãos de colegas juízes desde a década de 1990. Mas em 2015, o primeiro-ministro Narendra Modi e seu partido nacionalista hindu aprovaram uma emenda constitucional para dar ao governo maior influência nas indicações judiciais.
Mais tarde, naquele mesmo ano, ao ser solicitado a revisar uma tentativa de limitar seu próprio poder, assim como o Supremo Tribunal de Israel está sendo solicitado a fazer agora, o Supremo Tribunal da Índia derrubou a emenda.
Desde então, porém, o governo de Modi continuou a minar a independência judicial, inclinando o tribunal a seu favor, recusando-se a aceitar ou agir em algumas indicações enquanto acelerava aquelas que favorecia, argumentou Nandini Sundar, socióloga da Universidade de Delhi, em um novo artigo.