As Forças Armadas buscam afastar a crise de imagem desencadeada pelo escândalo das joias da Arábia Saudita presenteadas à família Bolsonaro. Pelo menos sete militares tiveram participação no caso, seja na tentativa de entrar ilegalmente com os itens no Brasil, em 2021, ou depois, nas diversas investidas para reaver os diamantes apreendidos pela Receita. A Defesa aponta que os militares envolvidos no caso devem ser investigados como civis, já que não há caracterização de crime militar, assim o caso não deve ser tratado como uma questão militar.
Na Aeronáutica, um oficial de alta patente, ouvido pelo Correio, lamentou o envolvimento de militares no caso, mas apontou que a única participação da Força Aérea Brasileira (FAB) foi a de ceder o avião que tentou reaver as joias em São Paulo. O oficial reconhece que o caso gera mais um desgaste na imagem das Forças, mas pondera que a FAB está muito envolvida na participação da operação humanitária para atendimento dos ianomâmis e que isso tem sido positivo para a imagem da Força Aérea.
O Exército, por sua vez, acredita que não caberia à Força a investigação "da conduta do tenente-coronel Mauro Cid diante do caso das joias apreendidas em outubro de 2021, no Aeroporto de Guarulhos". "O Centro de Comunicação Social do Exército informa que o referido militar se encontrava em cargo fora da Força", respondeu em nota à reportagem. O tenente-coronel Cid era ajudante de ordem de Bolsonaro, e diferentemente da maioria dos militares cedidos à Presidência, sempre estava com a farda militar.
A Marinha, que teve o maior número de militares envolvidos no escândalo, disse que "o assunto está sendo apurado fora do âmbito da Marinha do Brasil". Oficiais ouvidos pelo Correio não disfarçaram o desconforto com a atuação dos colegas de farda no caso.
Para o Ministério Público Militar, o assunto é civil. O MPM "atua em casos de crime militar federal (...). Não houve, até o momento, indicação de que as condutas relacionadas ao caso de que trata o pedido estejam descritas no mencionado artigo (de crimes militares)", diz em nota.
Com o escândalo afetando a imagem dos militares, fica mais difícil aos fardados projetarem suas posições para fora dos quartéis. O vexame tira prestígio da caserna, o que pode motivar discussões sobre mudanças internas. Em conversa com subordinados, o atual comandante do Exército, general Tomás Paiva, ao ler notícias sobre planos do PT em promover reformas nas Forças disse que "faz parte da cadeia de comando segurar para que isso não ocorra. Agora fica mais difícil, mas nós vamos segurar, porque o Brasil precisa das Forças Armadas".
A Controladoria-Geral da União (CGU) informou que não investigaria servidores militares de forma administrativa. Assim, todas as apurações realizadas pela Controladoria devem ser encaminhadas ao Ministério Público Federal que, por sua vez, deverá tomar as devidas providências.
O órgão disse estar realizando a apuração das possíveis irregularidades disciplinares cometidas por agentes públicos do Poder Executivo Federal e que atuará na aplicação das devidas penalidades, se for esse o caso. A CGU aplica apenas penalidades administrativas, abrangendo os servidores civis.
A Controladoria-Geral informou ainda que usualmente a instauração de apurações disciplinares é de competência do órgão ao qual o servidor está vinculado e exercendo suas atribuições, mas que, em casos de maior complexidade, pode instaurar essa apuração. "No caso em questão, a decisão da CGU por instaurar diretamente a apuração (...), pois o caso envolve o ex-presidente da República e sua esposa, um ex-ministro e o ex-secretário da Receita Federal, que eram dirigentes de alto nível hierárquico", explicou ao Correio a secretária-executiva da CGU, Vânia Vieira.
Bento Albuquerque: Almirante de Esquadra da Marinha, Bento era o ministro de Minas e Energia do governo Bolsonaro. O militar liderou a comitiva que tentou entrar com as joias irregularmente no Brasil
Marcos André dos Santos Soeiro: Tenente da Marinha, Soeiro era o assessor do ministro e foi quem teve as joias apreendidas em Guarulhos, ao tentar entrar no país sem declarar que estava com os presentes
Julio Cesar Vieira Gomes: Ex-oficial da Marinha do Brasil, Julio Cesar era o secretário que comandava a Receita Federal na gestão Bolsonaro e atuou diretamente para tentar liberar as joias, sob orientação do presidente
José Roberto Bueno Junior: Contra-almirante da Marinha, José Roberto foi chefe de gabinete de Bento Albuquerque e assinou ofícios da pasta tentando liberar as joias apreendidas em Guarulhos
Mauro Cid: Tenente-coronel do Exército, Cid cumpriu a ordem de Bolsonaro e enviou um emissário em avião da FAB, para tentar retirar as joias apreendidas no aeroporto
Jairo Moreira da Silva: Primeiro-sargento da Marinha, Jairo foi o emissário enviado por Bolsonaro até Guarulhos, para tentar retirar as joias dos cofres da alfândega
Cleiton Henrique Holzschuk: Segundo-tenente do Exército, Holzschuk era assessor da Ajudância de Ordens do Gabinete Pessoal do presidente da República e enviou ofício do departamento que pedia a liberação das joias para o presidente Bolsonaro