No entanto, ela nunca regularizou seu status migratório, e com o retorno de Donald Trump à Casa Branca, ela tem receios de que a hostilidade contra imigrantes e as políticas de imigração duras retornem, assim como no primeiro mandato do ex-presidente, como informa reportagem do Globo.
“No primeiro governo Trump, eu tinha medo de ser deportada porque ele colocava blitz de agentes da Imigração na rua. Não dá para sair à noite. Você fica com medo de que seus vizinhos chamem a Imigração para pegar você. Ele vai na televisão e fala: “Se você conhece um imigrante suspeito, denuncie.” Às vezes a pessoa não está fazendo nada e é denunciada” conta Lucimara, que já tem um vínculo significativo com os EUA.
No entanto, ela sabe que imigrantes com mais de 10 anos de residência no país têm mais proteção legal, o que não é o caso dos que estão há menos tempo.
Estima-se que 230 mil brasileiros vivam nos Estados Unidos em situação irregular. De acordo com dados do Departamento de Segurança Interna de 2023, o Brasil ocupa o oitavo lugar entre os países com mais imigrantes sem documentos nos EUA.
Nos últimos anos, 162 mil brasileiros foram flagrados tentando cruzar a fronteira do México com os Estados Unidos. O Itamaraty confirma que os EUA são o destino preferido para brasileiros, com cidades como Nova York, Boston e Miami sendo as mais procuradas.
Mesmo imigrantes com status regular temem as políticas de deportação de Trump, como é o caso de Elen Silva (nome fictício), que chegou aos EUA com seu marido e filha em 2018. Ela trabalha hoje em uma ONG de apoio a imigrantes e afirma que suas maiores preocupações são as ordens executivas de Trump, que durante seu primeiro mandato limitaram os direitos básicos dos migrantes.
“Do que eu tenho medo mesmo são as ordens executivas. A primeira coisa que ele faz é tirar os direitos dos imigrantes. E quando o imigrante precisa pedir auxílio ao governo, isso acaba diminuindo as chances de conseguir o green card depois”, diz Elen.
Analistas especializados apontam que, embora Trump tenha prometido uma grande deportação em massa, o impacto dessa política seria complexo e oneroso. A advogada Marta Mitico, presidente da Associação Brasileira de Especialistas em Migração e Mobilidade Internacional, lembra que as promessas dele na área de imigração, como a construção de um muro na fronteira, não foram efetivas em seu primeiro mandato.
“Trump é muito barulhento, mas em termos práticos ele fez menos deportações que [Barack] Obama, que foi mais legalista e firme, mas silencioso,” observa Mitico.
Apesar de o governo de Obama ter sido marcado pelo maior número de deportações legais da história dos EUA, com 3 milhões de imigrantes deportados, muitos imigrantes preferem a abordagem mais institucionalizada e menos hostil dos democratas. Lucimara Rodrigues aponta que, apesar de os democratas serem mais rigorosos nas deportações, o clima nos EUA é menos hostil em comparação com o governo Trump.
“Os democratas são os que mais deportam e fazem isso de uma maneira tão correta que você não tem como recorrer a um juiz de imigração. Mas na questão interna, para quem vive aqui, eles não deixam supremacistas brancos abusarem da gente” explica Lucimara.
Com o controle do Senado e da Câmara pelo Partido Republicano, e a maioria conservadora na Suprema Corte, tanto Elen quanto Lucimara temem mudanças nas leis de imigração, como a autorização para policiais locais abordarem imigrantes e denunciá-los, algo atualmente proibido.
Esse tipo de medida poderia levar a uma ampliação da vigilância sobre imigrantes indocumentados, alterando a dinâmica de imigração no país. O advogado de imigração Gustavo Nicolau explica que o clima anti-imigrante fomentado por Trump pode modificar as práticas legais nos Estados Unidos.
“O imigrante irregular, em teoria, geralmente só tem um processo de deportação iniciado se for fichado criminalmente. Há pessoas que passam 20 anos sem status regular, nunca foram pegas pela polícia e vida que segue. Ou, às vezes, são paradas por algo menor, como uma infração de trânsito, recebem uma multa e o policial nem pergunta sobre o status migratório,” afirma Nicolau.
Apesar de seu discurso duro, Trump também tem promovido uma agenda de imigração voltada para a atração de talentos. Nicolau acredita que os EUA precisam desesperadamente de imigrantes qualificados para manter sua competitividade, especialmente em setores estratégicos como tecnologia.
“O que Trump deve diminuir são vistos baseados em relação de parentesco e asilo humanitário, em que os democratas são mais permissivos, e incentivar vistos para mão de obra especializada,” analisa Nicolau.