Gilmar Mendes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmou que as Forças Armadas foram muito “lenientes” em relação ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e os atos golpistas ocorridos em Brasília no dia 8 de Janeiro. As falas do decano ocorreram em entrevista ao UOL. Gilmar ainda comentou sobre suas propostas para que leis sejam criadas em relação à participação politica de policiais, militares e procuradores:
Como o senhor avalia as respostas das instituições brasileiras diante dos acontecimentos de 8 de janeiro e da própria eleição de 2022?
Minha impressão é positiva. Tivemos algumas manifestações claras, denúncias que foram oferecidas contra aqueles que foram responsáveis pelos atentados de 8 de janeiro. Muitos já estão respondendo a processos, denunciados. Alguns foram presos, outros já foram liberados. Há um trabalho ainda de investigação muito consistente da parte da Polícia Federal e do Congresso Nacional. A CPMI está investigando e trazendo luzes sobre isso.
Se tivermos como paradigma o evento de 6 de janeiro [invasão ao Capitólio, em 2021], nos EUA, talvez estejamos muito mais adiantados.
Outro ponto que destacaria é o passo que demos no que se refere ao processo eleitoral e à responsabilização de Jair Bolsonaro, na questão de sua inelegibilidade. Há outros processos no TSE. Mas esse, sobre a visita dos embaixadores, já foi definido com a clareza que se viu. (…)
Bolsonaristas durante atos golpistas de 8 de janeiro. Foto: Reprodução
Mas isso basta?
Não. Eu acho que temos de organizar aquilo que eu chamo de fuga para frente. O que precisamos fazer para que episódios não ocorram, como a inação da Polícia Militar? Temos de ter uma corregedoria da polícia? Na Constituição, as PMs foram forças auxiliares do Exército. Nos últimos anos, essas atividades foram se esmaecendo. Isso deixou de ser prioridade. (…)
E o que se pode fazer em relação a isso?
Sugiro que fosse definido medidas de inelegibilidade. Quem quer fazer carreira política, sair do Exército ou do Ministério Público, que se licencie e saia. Sem poder voltar. Isso seria fundamental e seria uma resposta para essa possibilidade de politização. (…)
A resposta institucional está sendo suficiente para abafar o movimento?
Em parte sim. Mas precisamos perceber que temos de reforçar esses antídotos. O que surpreendeu positivamente é que as instituições tinham elementos para fazer o enfrentamento.
A Justiça Eleitoral se mostrou forte para enfrentar o falseamento dos votos. E todos viram que não havia possibilidade de fraude. Do outro lado, a contestação resultou canhestra. Imagina Walter Delgatti [o hacker da Vaza Jato] assessorando o Ministério da Defesa. É algo realmente chocante. Como descemos na escala das degradações. Mas as instituições cumpriram seu papel. Tem esse ativo que precisamos reconhecer.
Muitas outras democracias já teriam sido levadas, a essa altura. E muito provavelmente o projeto aqui envolveria o aumento no número de ministros no Supremo, num modelo húngaro e polonês. Mas todos os dias eu me levanto com essa missão de ficar como um grilo falante, alertando que precisamos fazer mais.
Não acredito que as Forças Armadas tenham se engajado num projeto de golpe. Mas é notório que foram muito lenientes com Bolsonaro. Se não quisermos ver outros exemplos, baste ver esse assentamento de pessoas na frente dos quartéis. Imaginemos que o MST quisesse fazer um assentamento diante de um quartel. (…)