Em Minas Gerais, a absolvição por clemência pelo Tribunal do Júri de homem que cometeu homicídio tem gerado muita polêmica.
O fato ocorreu em novembro de 2022 e foi julgado recentemente. O réu alegou na defesa que teria ficado transtornado ao saber que a esposa e uma irmã dela teriam sido estupradas quando criança pela vítima do homicídio.
Na apreciação do recurso contra a decisão de absolvição, o tribunal mineiro admitiu que é proibido ao juiz togado invadir a competência privativa do Tribunal do Júri. Somente em casos excepcionais de decisão absurda, escandalosa, arbitrária e totalmente divorciada das provas dos autos. O que, segundo os desembargadores, não fora o caso concreto.
A tese de defesa foi pedido de clemência dado o estado psicológico do réu e a confissão deste em juízo.
Ainda que o caso possa parecer inédito, não é. A tese de clemência faz parte do Tema 1.087, do Supremo Tribunal Federal (STF), que admite que o tribunal de apelação não determinará novo júri quando tiver pedido de clemência do acusado e os jurados acolherem a tese de defesa, desde que não contrária às provas do processo. E, por fim, que a tese de defesa tenha compatibilidade com a Constituição Federal.
Ainda que a tese da clemência possa ter passado pelo crivo positivo da nossa Suprema Corte, não deixa de ser muito polêmica. E muito difícil de ser sustentada em juízo. Exigindo muita habilidade dos profissionais do Direito.
Juristas contrários à tese sustentam que, no Estado Democrático de Direito, ainda que os jurados sejam livres para decidir arbitrariamente ou não, é preciso dotá-los de interpretações responsáveis, para em casos como tais não se conformem como um erro humano. Muitos entendem ser inconstitucional a clemência.
Tecendo considerações sobre a polêmica jurídica, o advogado Claucio Antunes, com forte atuação no Tribunal do Juri, assim se expressa: "A soberania dos veredictos por clemência é essencial para preservar a integridade e a humanidade do Tribunal do Júri. Ao permitir que os jurados levem em consideração não apenas as provas, mas também os aspectos morais e humanitários, este instituto fortalece a legitimidade do sistema jurídico e promove uma justiça mais equitativa e compassiva. Portanto, é fundamental preservar a autonomia dos jurados e a soberania de suas decisões, garantindo assim a integridade e eficácia do Tribunal do Júri".
Em verdade, a clemência é uma realidade na labuta forense. Inegavelmente! No julgamento do Recurso Extraordinário n. 982.182/STF, o ministro Gilmar Mendes disse o seguinte: “Os jurados sempre podem absolver por clemência aquele que consideram com participação no fato. A clemência compõe juízo possível dentro da soberania do júri, ainda que dissociada das teses de defesa.”
Por fim, a diferença entre os institutos do indulto e da clemência é que, naquele, tem que haver cumprimento da pena decorrente de sentença condenatória; neste não, porque na clemência não há sentença condenatória e deriva da amplitude de defesa garantida ao acusado e, por conseguinte, da soberania das decisões do Tribunal do Júri.