Os males que o grupo Globo causou ao Brasil já são notoriamente conhecidos. O grupo de mídia da família Marinho apoiou o golpe militar de 1964, deu sustentação à ditadura militar durante 21 anos e, pouco depois de pedir desculpas por esse seu histórico golpista, organizou o golpe parlamentar de 2016 contra a ex-presidente Dilma Rousseff, assim como a prisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante a Lava Jato, que tiveram como objetivo central implantar um choque neoliberal na economia brasileira, que retirou direitos dos trabalhadores e o poder do estado brasileiro sobre recursos estratégicos, como a energia e o petróleo.
Todo esse retrospecto já é suficiente para que seja celebrado o sucesso da Cazé TV, do jovem empresário Casimiro Miguel, nas transmissões dos Jogos Olímpicos de Paris. Com 200 profissionais envolvidos, incluindo jornalistas consagrados e atletas de renome, a Cazé TV tem feito várias transmissões simultâneas no Youtube, alcançando um público de massa. A empresa já havia sido testada em outros grandes eventos, como a Copa do Mundo de 2022 e a Eurocopa deste ano. Com transmissões que superam milhões de telespectadores simultâneos, a Cazé TV tem conseguido atrair grandes patrocinadores, quebrando o monopólio da Globo sobre a verba publicitária. O sucesso é tão arrebatador que a empresa de Casimiro já tem até um prédio próprio, de cinco andares, com equipamentos de última geração no Rio de Janeiro.
A notícia é boa para a democracia brasileira porque a excessiva concentração de poder midiático sempre significou concentração de poder político. Com seu domínio na comunicação, a Globo conseguiu eleger e derrubar presidentes, assim como nomear e demitir ministros. Hoje, não é mais tão simples assim. O grupo de mídia da família Marinho já não controla mais a narrativa dos fatos nem influi nos rumos da história como antigamente. Tanto é verdade que seu inimigo histórico, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, retornou ao poder de forma triunfante, desmoralizando o trabalho da Globo durante os anos da Lava Jato.
A concorrência que a Globo hoje enfrenta no esporte é essencial para a democracia brasileira porque os grandes eventos esportivos são aqueles que reúnem o maior número de telespectadores e, portanto, as maiores verbas publicitárias. Sem comer sozinha o bolo do esporte, a Globo terá menos força para suas demais operações, que também vêm perdendo apelo junto à audiência. Hoje, muitos brasileiros nem sabem os nomes de suas novelas, que perdem espaço para séries e reality shows nas plataformas de streaming, como Netflix, Amazon e Disney. Além disso, o jornalismo da Globo é também cada vez menos relevante, diante do crescimento de canais independentes e das redes sociais, onde suas armações e falsas narrativas são frequentemente desmontadas.
A transmissão do esporte em plataformas como o Youtube também cria um outro problema para a Globo, que é o desincentivo para que os brasileiros mantenham suas assinaturas de TV a cabo, o que enfraquece canais do grupo como o SporTV e a Globonews – esta, por sinal, cada vez menos relevante. Hoje, nos Estados Unidos, no Brasil e no mundo, há um movimento de cancelamento dessas assinaturas, diante da oferta gigantesca de conteúdo nas plataformas de streaming.
Alguns dirão que um grupo como a Cazé TV também acabará sendo capturado pelo sistema de dominação midiática e seus críticos apontam como evidência disso o pouco destaque dado à delegação palestina durante a cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos de Paris. É possível que isso venha a ocorrer, mas é praticamente impossível que uma empresa como a de Casimiro Miguel possa causar danos à democracia brasileira do mesmo modo que a Globo. Isso porque o destino da Cazé TV é se fixar no esporte, uma vez que ela dificilmente teria capacidade de construir alguma relevância no jornalismo econômico e político. O novo ecossistema de mídia favorece a fragmentação na oferta de conteúdo e a pulverização de criadores, cada vez mais especializados nos seus temas.
Nesta nova realidade, o modelo de negócios da Globo se tornou claramente ultrapassado. A empresa ainda fará pressões para promover a regulação das plataformas digitais, na tentativa de parar o trem da história, mas em algum momento este lobby será substituído pelo da mudança na lei que impede que empresas de mídia sejam controladas pelo capital estrangeiro, uma proteção de mercado que foi criada para supostamente defender interesses nacionais, mas protegeu grupos midiáticos alinhados ao imperialismo. Já na terceira geração da família Marinho, o mais provável é que a empresa, num futuro não muito distante, tome a decisão de ser vendida para algum gigante internacional. O fim da Globo está mais próximo do que muitos imaginam.