Desde a o golpe contra Dilma Rousseff, o encarceramento de Lula e a eleição de Bolsonaro, nenhuma hipótese pode ser descartada na política brasileira.
E a hipótese a ser considerada agora, entre as muitas em torno dos desfechos possíveis para a situação complicada de Bolsonaro, é a da armação de uma fuga.
Quando o cerco estiver fechado e o sistema de Justiça se sentir seguro para condená-lo e contê-lo com prisão, Bolsonaro pode fugir. Como fugiu no final de 2022 para os Estados Unidos.
A fuga para a Flórida, no dia 30 de dezembro, não foi prevista pelos videntes de Brasília que se consideravam bem informados sobre o que poderia acontecer se o fascismo fosse derrotado.
Nove dias depois da fuga, aconteceu a invasão de Brasília. Bolsonaro sabia que a invasão aconteceria, mas não poderia ter certeza alguma sobre o que resultaria do ato terrorista que fomentou como ajudante dos militares.
Fugiu para estar longe do cenário do crime. Se desse certo, poderia voltar como líder do golpe. Se desse errado, como deu, ficaria um tempo hibernando nos Estados Unidos. Ficou 89 dias.
O Brasil se dedicou, durante três meses, a um debate frouxo sobre a legalidade do uso do avião da FAB para a fuga e sobre a gastança de verbas públicas para sustentar o casal e seus assessores em Orlando.
Por que Bolsonaro fugiu, voltou e continua agindo com desenvoltura? Porque é favorecido pelo suporte político que ainda o mantém ativo.
Bolsonaro ainda tem a proteção, mesmo que vacilante, de Valdemar Costa Neto, não foi abandonado pela base do PL e do centrão que ajudou a eleger no Congresso e dispõe, para surpresa dos que ainda se surpreendem, do apoio de contingente expressivo da população, segundo as pesquisas.
Não há como fazer já o que não foi feito antes, apesar dos muitos crimes sob investigação. Mas é provável que esse cenário não se mantenha, se o entorno de parte da sua estrutura funcional de poder continuar se degradando.
As prisões de Anderson Torres, Mauro Cid e Silvinei Vasques e mais os inquéritos contra os deputados Alexandre Ramagem e Carlos Jordy fragilizam colunas de sustentação importantes das facções bolsonaristas.
Ainda não a ponto de permitir que finalmente tombe, mas num contexto suficiente para um nocaute técnico. Bolsonaro pode ser nocauteado em pé, pela sequência de golpes sofridos por esse entorno, que aos poucos pode chegar aos núcleos familiar e militar.
Se o Supremo for convencido de que é possível pegar Bolsonaro, porque sua contenção na cadeia não representaria risco político, as coisas acontecerão. Até porque, se não acontecerem, o sistema de Justiça será comido pelo fascismo.
E aí, se o sistema de Justiça finalmente for efetivo, em nome da proteção do próprio Judiciário – e não necessariamente de missões grandiloquentes em defesa da democracia –, Bolsonaro poderá ficar sem saída.
Bolsonaro pode fugir, desta vez sem avião da FAB. Só os tolos, que estão acima dos ingênuos, cometeriam o atrevimento de achar que essa é uma hipótese fantasiosa.
A fuga, no caso de uma condenação severa, seguiria a mesma receita do que ocorreu no final de 2022. Foge, deixa o tempo passar e aposta que, mais adiante, talvez com Trump de volta ao poder, as coisas se reacomodem.
Depois da eleição, Bolsonaro fugiu, ficou três meses fora, voltou, retomou os ataques ao sistema eleitoral e ao Supremo e está aí. É apenas inelegível.
Tirá-lo de uma eleição por oito anos parece muito, mas todos sabemos que é quase nada. O resto é o quase tudo ainda a acontecer. A fuga de Bolsonaro já pode estar sendo organizada.